quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Está chegando o Natal!!!!




Está chegando o Natal!!!! Tempo de festas, de comilança, parentada entupindo a casa, estresse com encenação na Igreja...

Nessa época as pessoas tendem a gastar mais ainda, comprar um monte de coisas, dando a impressão de abundância.

A mídia nos entope de propagandas, afirmando que se não comprarmos até gastar os dedos, não seremos felizes. Não interessa o menino Jesus e os valores, o que importa é comprar, comprar, comprar.

Abaixo, segue uma lista de 12 dicas para o consumo consciente no Natal, bolado pela Akatu.

Leiam, reflitam, divulguem.

Consumo Consciente no Natal

12 Dicas do Instituto Akatu


Guirlanda1.Natal com significado

Natal é tempo de renascimento. Os presentes são mostras de afeto renovado às pessoas queridas. Aproveite as festas de final de ano para estar com quem você mais gosta e para compartilhar um texto, ouvir uma música, refletir sobre o ano que passou e sobre os planos futuros.

Guirlanda2. Acerte no presente

Minimize o risco de errar nos presentes: pergunte o que as pessoas querem ganhar ou, se preferir fazer surpresa, reflita bem antes de comprar, buscando algo que tenha a ver com os gostos e interesses de quem você irá presentear.

Guirlanda3. Controle o impulso consumista do Natal

Compre menos, opte pelo “amigo secreto”, planeje suas compras, estabeleça um limite de gastos e não o ultrapasse.

Guirlanda4. Dê presentes alternativos

Faça você mesmo alguns dos seus presentes ou compre produtos artesanais feitos por comunidades, cooperativas ou entidades do terceiro setor e, sempre que possível, opte por objetos feitos com matéria-prima reciclada.

Guirlanda5. Não compre produtos piratas ou contrabandeados

Pagar menos por produtos piratas ou contrabandeados não compensa: você estará contribuindo com o crime organizado e com o conseqüente aumento da violência no seu bairro, na sua cidade, no seu país.

Guirlanda6. Escolha produtos de empresas social e ambientalmente responsáveis

Informe-se sobre a responsabilidade social e ambiental das empresas das quais vai comprar, consultando a Escala Akatu de Responsabilidade Social Empresarial, os Guias existentes no mercado, as publicações especializadas, ou os sites das próprias empresas.

Guirlanda7. Avalie bem quando comprar a prazo

Caso opte por comprar a prazo, verifique a taxa de juros e analise se a prestação é adequada ao seu orçamento para o ano novo. Caso pague à vista, busque negociar um desconto no preço. E não esqueça de fazer uma reserva no seu orçamento para os gastos que sempre ocorrem no início de ano.

Guirlanda8. Reduza o impacto das compras

Uma forma de reduzir o impacto das compras é usar o mínimo de embalagem possível. Prefira embalagens duradouras e que possam ser reutilizadas, tal como os cosméticos que adotam o refill. Ao embrulhar, use papéis e embalagens reciclados. E, se você tiver acesso a um computador, faça compras pela internet. Dessa forma, a mercadoria vai diretamente do Centro de Distribuição para sua casa, evitando maiores gastos de combustível no transporte de produtos.

Guirlanda9. Decore conscientemente

Opte por uma árvore de Natal natural plantada em um vaso, de modo a poder usá-la no próximo ano. Reaproveite os enfeites dos anos anteriores e, na compra de novos, prefira os artesanais ou feitos a partir de materiais reciclados. Após as festas, guarde os enfeites com cuidado e reutilize-os no próximo Natal. Na decoração com luzes, use lâmpadas de baixo consumo e apague-as antes de dormir.

Guirlanda10. Faça doações

O Natal é uma boa época para você doar o que não usa e que pode ser útil para outras pessoas. Ao apoiar entidades que acolhem os menos favorecidos, você estará contribuindo para que tenham um Natal mais feliz.

Guirlanda11. Ceia de Natal consciente

Compre apenas a quantidade de alimentos que você estima que realmente será consumida. Prefira produtos cultivados na sua região, reduzindo assim o custo de transporte e o desperdício. Mesmo que a família seja grande e o trabalho depois da ceia também, não use pratos e copos descartáveis, que viram lixo. Opte pelos de porcelana e vidro, que podem ser lavados e reutilizados. E evite comer e beber em excesso.

Guirlanda12. Dissemine o consumo consciente

Aproveite a festa natalina e dissemine o consumo consciente entre seus amigos, colegas de trabalho e familiares. Esse é o melhor presente que você pode dar à humanidade. E lembre-se: há coisas que por um milagre, quanto mais consumimos, mais se multiplicam. Por isso, no Natal, consuma exageradamente amor, beleza, alegria, carinho e amizade.

sábado, 8 de dezembro de 2007

Brasil perderá R$ 320 bilhões se não investir nos jovens

70% dos gastos sociais no Brasil são destinados ao grupo com idade acima de 61 anos; já o público de 15 a 24 anos recebe apenas 6%


O Brasil perderá até R$ 320 bilhões na próxima década se não investir nos jovens em risco, estima o Banco Mundial (Bird). O estudo alerta que o maior esforço deve ser feito nos próximos três anos, pois com o envelhecimento da população brasileira dificilmente o País terá no futuro um potencial jovem como o de hoje.

O cálculo considera os custos do atendimento do público de 15 a 24 anos em situação de vulnerabilidade e uma estimativa de perdas que a sociedade pode ter pelo fato destes jovens não disporem de oportunidade para se desenvolver plenamente. “Se forem feitos investimentos agora, o Brasil terá um ganho de R$ 320 bilhões para a próxima geração. É um excelente negócio, sem considerar os ganhos sociais e de qualidade de vida”, afirma a especialista em Desenvolvimento Social e Sociedade Civil do Banco Mundial, Zezé Weiss.

Os dados estão no relatório Jovens em Situação de Risco no Brasil, apresentado recentemente pelo Bird. Já as informações sobre a redução gradual do número de jovens nas próximas décadas podem ser conferidas na Projeção da População do Brasil 1980-2050, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O documento mostra que se em 2007 as pessoas com 15 a 24 anos compõem 18,3% da população (34,6 milhões), em 2030 representarão 14,9% (35,4 milhões). Mas os indivíduos com mais de 55 serão maioria: 53,2 milhões, ou 22,3% do total.

Quanto a sociedade perde

O estudo do Bird contabiliza os gastos do governo per capita e para o conjunto da população de 15 a 24 anos, com base no número de jovens nesta faixa etária em 2004 – que era de 35.163.312. Os cálculos se referem às despesas durante toda a vida do jovem, que na verdade é o número de anos de trabalho (40 anos), uma estimativa informal baseada em dados da PNAD do IBGE.

Veja alguns destaques do relatório:

Os gastos públicos diminuem quando o jovem abandona a escola cedo, na medida em que o Estado economiza em salários de professores, estrutura e material didático. Mas os benefícios perdidos, decorrentes da baixa escolaridade, são de R$ 755 milhões para cada geração de jovens.

Os gastos do governo com os jovens desempregados – devido às altas taxas de desocupação nesse segmento – são altos. Totalizam entre R$ 120 milhões e R$ 224 milhões todo ano.

O público com idade entre 16 e 24 anos que contrai o vírus HIV custa ao Estado R$ 297 milhões em cuidados médicos durante toda a vida do jovem. Como este deixa de produzir ou reduz sua produção, a perda financeira para a sociedade referente ao conjunto de jovens infectados equivale a R$ 554 milhões nesse período.

A violência cometida por jovens custa ao Tesouro R$ 478 milhões em despesas diretas, durante toda a vida do conjunto de indivíduos envolvidos. Os gastos com prevenção de delitos, prisões, julgamentos, reparações ao patrimônio e despesas médicas chegam a R$ 109,7 mil por jovem nesse período.

Os prejuízos para o próprio jovem

Além de calcular os custos públicos, o estudo do Bird estima as perdas econômicas para o próprio jovem, em virtude da situação de vulnerabilidade. De acordo com o documento, uma pessoa que não completa a Educação Básica na juventude priva-se de ganhar de R$ 32.732 a R$ 68.440 ao longo da vida, por exemplo. Se tivesse concluído o Ensino Superior, poderia ter ganho até R$ 310.052. Para toda uma geração de jovens, isso representa uma perda de R$ 297 bilhões.

Juventude recebe só 6% dos investimentos sociais

O relatório do Banco Mundial traz um dado especialmente preocupante: hoje, enquanto a população jovem ainda é maioria, o segmento é que menos recebe investimentos. Segundo o documento, 70% dos gastos sociais no Brasil são destinados ao grupo com idade acima de 61 anos (pagamento de aposentadorias). Já o público de 15 a 24 anos recebe apenas 6% e registra indicadores sociais preocupantes, tais como:

34,5% dos jovens brasileiros vivem em famílias com renda per capita inferior à linha da pobreza (menos de R$ 176,29 mensais), segundo a estudo Radar Social, publicado em 2005 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O jovem tem dificuldades para concluir o Ensino Médio. Dados do Censo Escolar mostram que mais de um milhão de alunos reprovaram (11% do total) em 2005, outro 1,2 milhão abandonou a escola (14%), e 4,1 milhões (46%) estavam em situação de defasagem idade-série. Apenas 62% dos estudantes termina o Ensino Médio entre 17 e 19 anos, idade considerada adequada, enquanto 32,5% só conseguem fazê-lo após os 20 anos.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) do IBGE, em 2005 existiam 5,7 milhões de indivíduos de 20 a 24 anos desempregados, o que representa 33% dos 17,3 milhões de brasileiros nessa faixa etária.

A violência é uma grave ameaça às próximas gerações. Se apenas 3% dos óbitos de adultos e idosos são causados por homicídios, entre os jovens o percentual é de 39,7%, segundo o Mapa da Violência 2006 – Os jovens do Brasil, da Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI). Os homicídios entre o público de 15 a 24 anos cresceram 64,2% na última década, contra um aumento de 48,4% para os demais. A diferença é clara no índice de mortalidade: são 51,7 óbitos por 100 mil habitantes entre os jovens, contra 27/100 mil para o resto da população.

Política nacional de juventude começou tardia

Entre as causas dos baixos indicadores, especialistas colocam o atraso na adoção de uma política nacional de juventude. Em 2001 – quando o Brasil criou sua política – 82% dos países do mundo já o tinham feito e 89% já possuíam mecanismos de coordenação nacional nessa área, aponta o Conselho Nacional de Juventude (Conjuve).

No caso brasileiro, há um longo caminho a percorrer. A socióloga Maria Virginia de Freitas, coordenadora do Programa Juventude da ONG Ação Educativa, considera que a área educacional ainda recebe pouca atenção, apesar de ser essencial para prevenir situações de risco. “Os jovens inseridos no Ensino Médio têm extrema dificuldade de entrar no mercado de trabalho e na universidade”, afirma. Maria Virginia defende uma política nacional de trabalho para a faixa de 15 a 24 anos, a exemplo da política educacional, e não apenas programas pontuais como o Primeiro Emprego.

Para a socióloga Miriam Abramovay, conselheira do Conjuve, falta monitoramento das iniciativas que compõem a política nacional. “Pro-jovem, Primeiro Emprego, nenhum desses programas foi avaliado sobre o impacto que causou na vida dos jovens. Não há acompanhamento”, critica. No momento em que a especialista fez essa avaliação, o Governo Federal anunciou – no dia 31/8 – que o Primeiro Emprego será extinto em 2008, por não cumprir os objetivos a que se propôs. De 2003 a 2004 o programa consumiu R$ 163,7 milhões do orçamento de R$ 449 milhões de que dispunha no período (36,4%). Alcançou somente 0,55% de sua meta, inserindo 3.936 jovens no mercado de trabalho. O objetivo era inserir 260 mil por ano.


Fonte: PJ Maringá


sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Papai Noel ou Menino Jesus?

Buenas.

Vou postar aqui um texto muito massa sobre o Natal, escrito por nada mais nada menos que o grande Leonado Boff.

Está chegando mais um Natal. Tempo de alegria, festa, parentada entupindo a casa e comilança, sem falar dos inúmeros presentes.

Até o Natal serão dias muito corridos, mas não devemos nos perder nos caminhos do capitalismo. Claro que ninguém precisa se enfiar numa caverna durante o períodos de festas e colecionar pedrinhas, mas uma reflexão é boa e se mudarmos uma coisinha, melhorando o mundo, já valeu a pena.

Mas vamos ao texto.

Abração

---------------

Devido à minha barba longa e aos cabelos brancos, muitas crianças me vêem e me chamam de Papai Noel. Eu lhes explico, sem convencê-las, que sou apenas o irmão do Papai Noel. E que minha função é olhar pelas crianças, observar se elas estudam direitinho, se tratam bem os coleguinhas e se escutam os bons conselhos de seus pais. Digo-lhes que depois conto tudo ao Papai Noel que, então no Natal, vai lhes trazer belos presentes. Num dia desses, uma me seguiu curiosa. Quando me viu entrar no carro correu para o pai e lhe disse:"Pai, o Papai Noel não veio de trenó; ele veio de carro".

Esse é um tipo de Natal com seu respectivo imaginário. Papai Noel é uma figura do mercado. Ele é o bom velhinho que trata de seduzir as crianças para que seus pais lhes comprem presentes. A memória de que ele representa São Nicolau que também trazia presentes despareceu para dar lugar à figura infantilizada do bom velhinho que tira do saco surpresas que antes foram compradas e postas lá dentro.

Como em todas as casas há televisão – pode faltar o pão mas nunca a televisão – as crianças pobres vêem o Papai Noel e sonham com o mundo encantado que ele mostra, cheio de presentes, carrinhos, bonecas e brinquedos eletrônicos a que elas dificilmente terão acesso. E sofrem com isso apesar de manter o brilho encantado de seus olhinhos infantis. O mercado é o novo deus que exige submetimento de todos. Dai que as crianças pressionam seus pais para que Papai Noel também passe lá por "casa". Então são os pais que sofrem por não poderem atender ao filhos, seduzidos por tantos objetos-fetiche mostrados pelo Papai Noel.

O mercado é uma maiores criações sociais. Mas houve e há muitos tipos de mercado. O nosso, de corte capitalista, é terrivelmente excludente e por isso vitimizador de pessoas e de empresas. Ele é apenas concorrencial e nada solidário. Só conta quem produz e consome. Quem é pobre deve se contentar com migalhas ou apenas viver na marginalidade. No tempo de Natal, o Papai Noel é uma figura central do consumo para quem está dentro do sistema e pode pagar.

Diferente é o Natal do Menino Jesus. Ele nasceu de uma família pobre e honrada. Por ocasião de seu nascimento numa gruta, entre animais, anjos cantaram no céu, pastores ficaram imobilizados de emoção e até sábios vieram de longe para saudá-lo. Quando grande, fêz-se exímio contador de histórias e pregador ambulante com uma mensagem de total inclusão de todos, começando pelos pobres a quem chamou de bem-aventurados. As pessoas que guardam sua memória sagrada, na noite de Natal, ouvem a história de como nasceu, celebram a presença humanitária de Deus que assumiu a forma de uma criança. Festejam a ceia com a família e os amigos. Aqui não há mercado nem excluidos. Mas luz, alegria e confraternização. A troca de presentes simboliza o maior presente que Deus nos deu: Ele mesmo na forma de um infante. Ele nos alimenta a esperança de que podemos viver sem o Papai Noel que nos vende ilusões.

Dom Pedro Casaldáliga diante de um indiosinho recem-nascido escreveu:"Não vi a tal da estrela, mas vi um Deus muito pobre. Maria estava desperta, desperta estava a noite. E estava sobressaltado para sempre o rei Herodes". O rei Herodes não é mais uma pessoa, mas um sistema que continua devorando pessoas no altar do consumo solitário.



terça-feira, 4 de dezembro de 2007

O fim da picada

Pessoal, segue abaixo texto retirado da agência Carta Maior.



Abração

----------------------

Em dezembro vai nevar no Parque Ibirapuera, em São Paulo. Mudança no clima? Não, é de novo o clima mental que se recusa a se desfazer do passado e se abrir para o presente. É a nossa “élite” de visão colonizada, a mesma capaz de acolher a palavra de um rei europeu mandando um chefe de estado latino-americano calar a boca.

Numa das aulas de alemão que estou freqüentando em Berlim, o simpático professor comentou que “não havia neve no Brasil”. Tanto quanto meu alemão ainda pequerrucho permitia, corrigi a informação, como sulino que sou. Disse que havia sim neve no Brasil, embora esporádica e restrita a um Brasil relativamente pouco conhecido pela maioria dos europeus, o do paralelo 30 e arredores.

Mal sabia eu o que me esperava agora de retorno ao Natal paulistano. No primeiro fim de semana de dezembro inaugura-se a decoração de Natal no Parque Ibirapuera. Trata-se de gigantesca árvore de Natal, como sempre iluminada à noite. E leio, estarrecido, a informação de que todas as noites, durante dez minutos, canhões especiais despejarão neve artificial sobre a árvore.

Lembrei-me dos pinheiros natalinos decorados com algodão para imitar a neve do hemisfério norte nesta época do ano. Patópolis é o ideal de um certo Brasil, de uma certa élite do nosso país. Antes do fato “accompli”, penso que alguém imaginou isso. Levou para uma mesa de discussão, na esfera pública. Houve argumentações, melhorias foram feitas ao projeto, até chegarmos a essa imagem de... De quê, mesmo? De lugar nenhum, de um não-lugar, daquele eternamente “fora de nós” para onde jogamos nosso ponto de vista quando não queremos reconhecer a nossa identidade.

Essa árvore de natal decorada com neve artificial... Artificial? Não! A neve espalhada a canhonaços em pleno verão brasileiro é “de verdade”, é fabricada sim, “made in Brazil”, mas pouco importa. É a democracia cultural que nossa élite imagina: trazer aos brasileiros uma paisagem de sonho, que poucos podem conhecer...

Sempre desconfio que a imagem eufórica do “país tropical” tem uma outra face disfórica, aquela que a gente sempre tem quando não se suporta o que de fato se é. Essa árvore nevada em pleno verão é uma imagem tributária daquela teoria de que nossa desgraça é estar ao sul do Equador, assim como nossa desgraça foi sermos um país de tradição ibérica e católica, ao invés de protestante e anglo-saxã, visão que conta até com a bênção de antropólogos e sociólogos.

Essa árvore, que é o kitsch do kitsch do kitsch, ela se afasta de tudo aquilo que podemos ou queremos ser de fato, ela é uma negação do futuro, do presente, ela se refugia num passado de visão colonial, que é o que Brasil, a duras penas, está abandonando.

Podemos achar que um mandatário como Hugo Chávez exagera na retórica. Mas ver gente, como se viu e leu na imprensa brasileira, saudando o “porque no te callas?”, dirigido por um rei europeu a um mandatário latino-americano, é de doer na alma. Mas há um lastro cultural para isso, expresso nesta árvore cheia de neve em pleno verão paulistano. Esse lastro fala de uma visão sempre desfocada de nós mesmos, de não reconhecimento quando não de ódio ou desprezo diante do que de fato somos. Esse lastro fala de um sentimento que habita corações povoados por calendários (folhinhas, como se dizia antigamente) impressos na Suíça, com paisagens invertidas em relação às do nosso hemisfério sul.

Até mesmo corações de esquerda enveredam por esses sentimentos, querendo ver em nossas vicissitudes históricas imagens de acontecimentos outros, sem perceber nelas a especificidade ou mesmo a originalidade que contém, para o bem e para o mal. Assim se fala, por exemplo, das missões jesuíticas do então chamado “Paraguai”, do século XVIII, como uma antecipação do comunismo do século XX. Ou descreve-se a comunidade de Canudos como a “nossa Comuna de Paris”. No mesmo diapasão especula-se, em outra ponta, se Hugo Chávez, para retomar o exemplo venezuelano, é um Hitler, um Stálin, ou até mesmo um Lênin condutor dos povos...

Essa árvore de Natal, por melhores que tenham sido as intenções em torno da mesa onde ela foi planejada, é a imagem que na verdade nos quer calar. Quer nos roubar o dom da multiplicidade, ajuda a nos ver numa esquizofrenia entre o “tropical abençoado por Deus” e a saudade de uma página de calendário cheia de neve que, na verdade, não existe em lugar nenhum, em nenhum hemisfério norte real, talvez, quem sabe, em Patópolis, em policromia tão artificial quanto essa neve que se jogará sobre a iluminação no Ibirapuera.

Bem mais difícil é reconhecer o Brasil como ele é: um espaço múltiplo de identidade e de identidades múltiplas, contendo florestas, pantanais, planaltos, escarpas, rios, muitos rios e lagos e lagoas, um litoral extenso, e numa de suas pontas um começo (ou fim?) de pampa. Bem mais difícilo é reconhecer que o litoral do Brasil é belo extenso, e merece a admiração do mundo inteiro, mas que o Brasil não é um país litorâneo. E que o Brasil é um estuário de paisagens, de climas diferenciados, de culturas, de etnias, de origens e futuros conflitantes, e que é nessa paisagem que temos de fazer escolhas que nos construirão enquanto cultura voltada para a multiplicidade e para a convivência. Para a democracia feita de nós, em todos os sentidos. O “nós” do “nosso povo”, aquele com uma multiplicidade de cores e de caras, e dos “nós” que temos de desatar para termos um futuro “nosso”, não emoldurado pelo que jamais seremos, não por incapacidade, mas simplesmente porque nossas especificidades e nossas pluralidades são as nossas, e não “outras”.


Flávio Aguiar é editor-chefe da Carta Maior.